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Além da Hora do Planeta

29/03/2009

Estive pensando ontem sobre a Hora do Planeta. Sem dúvidas, ela representa mais do que o simples ato apagar de luzes ou o desligar de toda energia elétrica. É uma mobilização por uma causa ambiental, mas vai além, porque nos traduz comportamentos simbólicos (e às vezes imperceptíveis) do ser humano e da sociedade.

Desligar-se! Deixar a inércia do escuro nos guiar, sem depender da eletricidade, das tecnologias, das luzes. Esse foi o desafio.

O jornalista, Marcelo Rubens Paiva, escreveu uma crônica no jornal O Estado de São Paulo no dia 28/03 sobre o escuro. É um relato sobre o tempo que ele ficou na escuridão, esperando a energia voltar depois da chuva em SP.
Alguns trechos são interessantes (e cheios de significados) para ampliar a reflexão sobre a Hora do Planeta, sobre o ambiente, sobre hábitos.

“Todos os paulistaos têm uma história para contar sobre a chuva de terça-feira, que desabou na cidade. A luz se apagou em vários bairros, perderam-se carros, casas e vidas, pessoas ficaram ilhadas…
Particularmente, acho lindo esses torós que humilham os simples mortais, provam o poder supremo da natureza – que manda, rege, de quem somos escravos e nos obriga a parar. Nos obrigam a esperar humildemente, rompem planos e rotinas, caotizam nossas vidas. Há um dedo de Deus em cada raio, terremoto, furação, tempestade, erupção: o homem retorna à sua fragilidade, e todo conhecimento é inutilizado.
(…)
Vi da varanda que a chuva de terça era incomum.
(…)
Às 16 horas, um estouro. E outro. Acabou a luz. Me preparei para uma noite no escuro.
(…)
Com a gata no colo, descobri que não tinha nada para fazer, a não ser olhar a janela, constatar que as ruas alagavam, o bairro tinha oásis ainda iluminados e o caos se instalava.
Não me restava fazer outra coisa a não ser pensar.
(…)
Às 18 horas, escureceu completamente. Sem livros, TV, internet, música. Durante 3 anos na Unicamp, vivi com amigos em casas sem TV ou telefone. Não tínhamos carro, um luxo naquela época. Nada de DVD, internet. Nade de celulares, e-mails, msn. E a vida corria como se a eletricidade não interessasse.
(…)
Às 20 horas, no vazio do escuro, meus olhos, como os da gata, se acostumaram com a luz da cidade. As buzinas do trânsito infernal nos davam paz: pelo menos não somos vítimas diretas do caos e estamos secos.
(…)
Ás 22 horas, voltou a luz. O bairro gritou, comemorou. Desliguei os interruptores. Fiquei ainda alguns instantes com o meu escuro, admirado. Mas passou.
Chequei os e-mails, as notícias. E não pensei duas vezes. Deixei a gata miando sozinha. Peguei a chave do carro, desci o elevador rezando para não pifar, entrei no carro e fui beber um uísque no bar com os amigos de sempre.
(…)
Até a próxima tempestade me trazer lembranças. Saudades, eu? Para que ser herói na própria solidão e refém do passado? Veio a bonança.”

Gabriela Alem

2 Comentários leave one →
  1. Lalá permalink
    29/03/2009 19:40

    Também tive um momento único nessa hora do planeta, no escuro. Fiquei na janela, com outras pessoas, observando a cidade. Muitas pessoas estavam na janela aquela noite.
    Parece que a escuridão nos traz de volta a humanidade, nos faz recolher a nós mesmos e ponderar nossos pensamentos e sentimentos. Afinal, no escuro não há nada que ver com os olhos.

  2. Bia permalink
    30/03/2009 10:23

    Muito bom o post e o comentario da lalá realmente completa como foi o meu momento, muitas pessoas na janela. Esses dias eu vi num site umas coisas sobre aquecimento global e algumas coisas eu nao sabia, mas achei muito interessante, quem quiser ver: http://www.natgeo.com.br/br/voce-sabia
    Valeu!

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